´´Observe as tendências mas não Siga a maioria`` Thiago Prado


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quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Para Coppead, internacionalização é via de mão dupla

SÃO PAULO - O status da economia brasileira pós-crise aumenta naturalmente a demanda por qualificação de nível internacional. Essa é a opinião do vice-diretor de educação executiva da Coppead-UFRJ, Vicente Ferreira. A influência do ensino brasileiro, segundo ele, deve acompanhar o ritmo.

"A internacionalização é uma via de mão dupla. Ao mesmo tempo que empresas estrangeiras instaladas no Brasil captam e cultivam talentos brasileiros, estrangeiros querem entender o que tornou o Brasil o que é hoje", comenta.

O fluxo de estrangeiros que chegam ao país procurando aperfeiçoamento profissional tem crescido em ritmo acelerado nos últimos dois anos, diz ele. Até 2007, a Coppead cumpria uma trajetória histórica de 30 alunos estrangeiros por ano. Em 2008, esse número passou para 50. Neste ano, foram 80. Em um cenário de recuperação de crise, segundo ele, 2010 promete projeção ainda maior.

O interesse global pelo Brasil, porém, poderia ser mais bem aproveitado no MBA não fosse a barreira do idioma. Na Coppead, as turmas para estrangeiros são fechadas. As aulas, ministradas em inglês. 

"São geralmente de duas semanas a três meses de imersão em Brasil. Praticamente um estudo de caso", diz. As turmas abertas, com aulas em português, ainda concentram poucos estrangeiros. De 50 estudantes, apenas três ou quatro vêm de fora, diz ele.

Ou seja, para quem procura um MBA com o objetivo de ampliar a rede de contatos internacionais, ir para o exterior ainda é a melhor opção. A rede de convênios da Coppead, segundo Ferreira, permite que interessados em Europa, Estados Unidos e os demais países do BRIC tenham oportunidade de passar.

Hoje, o chamado Full Time MBA -- mestrado profissional de tempo integral, stricto sensu -- é a especialização do gênero vinculada à Coppead que mais exporta estudantes. "O custo de oportunidade dessa modalidade é diferente. Trata-se de um mestrado, gratuito, de dedicação exclusiva. Você fica fora do mercado durante dois anos, pois entende que o que vai ganhar em cinco anos é muito maior. Muitos profissionais fazem poupança para ter um aperfeiçoamento pleno, aqui e lá fora".

Ranqueado pelo Financial Times entre os 100 melhores do mundo, o MBA integral tem 20 alunos por ano com idade média de 40 anos. Fazem parte desse grupo executivos com carreira já consolidada que, segundo ele, querem deixar a estrutura funcional das empresas e galgar cargos estratégicos. "Há um momento na carreira em que o profissional se torna menos relevante, já que seu conhecimento é muito específico. A ideia é pensar em meios de tornar esse conhecimento específico aplicável genericamente; é tornar o profissional versátil", afirma Ferreira.

Já o MBA executivo, com quatro a cinco turmas de 30 alunos por ano, serve para aqueles que não dispõem de tempo para investir -- o curso dura um ano --, mas que também querem "oxigenar" áreas estratégicas das empresas. Com custo de R$ 30 mil, o curso é procurado e financiado em sua maioria (70% a 80%) por empresas, que tratam diretamente com a instituição.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

O clima e seus efeitos político-econômicos

O homem acredita que pode governar o mundo. Mas quem o governa são, na realidade, as alterações climáticas e geofísicas. Uma rápida inspeção da história através dos séculos é suficiente para mostrar como são notáveis as relações entre os eventos culturais, políticos, econômicos e a meteorologia.

O próprio desenvolvimento do processo civilizatório do homem pré-histórico sofreu sua grande eclosão entre 10 mil e 12 mil anos atrás, no fim da última grande era glacial. Foi sem dúvida a suavidade do clima que favoreceu a produção agrícola e permitiu melhor alimentar os indivíduos. Naquela ocasião, os homens deixaram suas cavernas, começaram a construir suas aldeias, desenvolveram a agricultura e progressivamente se iniciaram as técnicas metalúrgicas.

A idade do bronze sucedeu à idade da pedra. Deste então, o processo de desenvolvimento do homem foi muito rápido, quase explosivo. O caminho percorrido pela humanidade nos últimos 5 mil anos foi imenso, quase monstruosamente gigantesco comparado com o que se passou nos últimos 500 mil anos.

Uma prova desta influência do clima pode se encontrar na própria história da França. O reino de Luís XIV – atualmente homenageado com uma belíssima exposição no Castelo de Versalhes, de outubro/2009 a 7/02/2010 – foi glorioso por ter coincidido com o período de 1630 a 1685, quando o tempo foi particularmente suave no plano meteorológico. Todavia, a partir de 1685, o céu se tornou menos favorável. O ano 1709 foi particularmente desfavorável, com um inverno muito rigoroso (temperaturas de 22 graus negativos) e inundações catastróficas. Gradualmente, as festas na Corte começaram a rarear para finalmente cessarem. Estas calamidades se sucederam durante todo o século 18, provocando colheitas desastrosas. O descontentamento popular foi crescendo ao longo dos anos até eclodir, em 1789, a Revolução Francesa.

Em face da ausência de um documentário-testemunho sobre o ano da Revolução Francesa, o escritor e historiador suíço Jean Starobinski (*1920), em 1789: Les emblèmes de la raison (1973) procurou reunir manifestações culturais de escritores, pintores, músicos, cientistas e outros, que, interligados, permitissem melhor compreender e/ou reconstruir o panorama cultural que caracterizou a segunda metade do século 18.

Este ensaio starobinskiano evoca figuras como Tiepolo, Lagrange, Laplace, Mozart, Sade, Rousseau, Goya e Bernardin de Saint-Pierre. Focalizando estes dois últimos, Starobinski discorre sobre a situação climática que antecedeu a crise ocorrida 200 anos atrás, não como um fator determinante mas como um simbolismo da época. Para isso, recorreu à tela O inverno, de Francisco de Goya (1746-1828), e a um relato de Bernardin de Saint-Pierre:

“No dia 1º de maio deste ano de 1789, ao nascer do sol, desci para o meu jardim, para ver o estado em que se encontrava depois daquele terrível inverno em que o termômetro baixou, no dia 21 de dezembro, a 19 graus abaixo de zero. A caminho, pensava no granizo desastroso de 13 de julho, que atravessava todo o reino. Lá entrando, não vi mais repolhos, nem alcachofras, nem jasmins brancos, nem narcisos; quase todos os meus cravos e meus jacintos haviam perecido; minhas figueiras estavam mortas, assim como meus viburnos, que costumavam florir no mês de janeiro. Quanto às minhas jovens heras, estavam quase todas com os galhos secos e com a folhagem cor de ferrugem”.

Convém lembrar que o frio que tem desempenhado um papel essencial nas campanhas militares, em particular na Rússia, parece estar associado a dois movimentos sociais franceses. De fato, as crises políticas de 1789 e 1830 sucederam-se a invernos extremamente rigorosos.

Pelo menos no caso da Revolução Francesa, as condições meteorológicas de 1788 e 1789 não estão totalmente dissociadas dos acontecimentos que se iniciaram em 14 de julho. De início, na primavera de 1788, ocorreu uma seca que produziu uma colheita deficitária. Depois, veio o inverno de 1788-89. Em Paris, a temperatura média de dezembro foi de 6,8 graus centígrados abaixo de zero. Em 31 de dezembro, o termômetro atingiu temperatura de 21,8 graus abaixo de zero no Observatório de Paris. O gelo obstruiu os portos franceses. Registraram-se 86 dias de gelo durante o inverno parisiense – um autêntico recorde – de novembro de 1788 a março de 1789. O Rio Sena esteve congelado até o Havre, impedindo o seu uso. Nas províncias não sucedeu nada melhor: o porto de Marselha esteve coberto de gelo, o Ródano congelou de 27 de dezembro a 13 de janeiro. O mesmo ocorreu no Elba, Reno, Danúbio, Loire, Garona etc.

O preço da lenha para fogões e para o aquecimento subiu 91%. O preço do trigo em 1789 sofreu uma elevação de 150% e o do centeio subiu 165%. O dia 14 de julho de 1789, aliás, coincidiu com o ponto culminante das altas dos preços, na França, em todo o século 18.

As condições do tempo também foram uma das possíveis causas da insurreição de 27-29 de julho de 1830, chamada a dos três gloriosos, por ter durado três dias, após o que se obteve a abdicação de Carlos X. Convém notar que em um século, de 1750 a 1850, os invernos mais rigorosos foram os de 1788-89 e 1829-30. Assim, em dezembro de 1929 a temperatura média em Paris desceu a 3,5 graus abaixo de zero. A temperatura mínima absoluta foi de 17,2 graus abaixo de zero, em janeiro de 1830.

Não podemos afirmar que as condições meteorológicas determinem a eclosão de conflitos sociais, mas na realidade contribuem para essas ocorrências, principalmente quando associadas a fatores político-econômicos.


Ronaldo Rogério de Freitas Mourão é astrônomo.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

O orçamento do Pentágono: o maior de sempre e a crescer

por Sara Flounders



Cost of U.S. Wars Since 2001

$931,835,696,096

See the cost to your community at www.costofwar.com

Cost of War in Iraq

$700,239,251,203

See the cost to your community at www.costofwar.com

Cost of War in Afghanistan

$231,596,444,845

See the cost to your community at www.costofwar.com



Em 28 de Outubro o presidente Barack Obama assinou o Defense Authorization Act de 2010, o maior orçamento militar da história dos EUA. Ele é não só o maior orçamento militar do mundo como também é maior do que as despesas militares somadas de todo o resto do mundo. E é um crescimento imparável. O orçamento militar de 2010 — o qual não cobre nem mesmo muitas despesas relacionadas com a guerra — chega aos US$680 mil milhões. Em 2009 era de US$651 mil milhões e em 2000 de US$280 mil milhões. Mais do que duplicou em 10 anos.



Que contraste com a questão dos cuidados de saúde.

O Congresso dos EUA tem estado a debater um plano de cuidados de saúde básicos — o que todos os outros países industrializados do mundo de certa forma possuem — durante mais de seis meses. Tem havido intensas pressões de companhias de seguros, ameaças da extrema-direita e terríveis advertências de que um plano de cuidados de saúde não deve acrescentar nem um tostão ao déficit.



Mas em meio a este debate de vida e morte sobre cuidados médicos para milhões de trabalhadores e pobres que não têm cobertura de saúde, um subsídio colossal às maiores corporações dos Estados Unidos para contratos militares e sistemas de armas — um agravamento do déficit real — foi aprovado mal havendo qualquer discussão e artigos em jornais.



A organização Physicians for a National Health Program estima que um plano de saúde universal e abrangente de pagador único (single-payer) custaria US$350 mil milhões por ano, o que realmente significaria a quantia poupada através da eliminação de todos os custos administrativos no atual sistema privado de cuidados de saúde — um sistema que deixa de fora quase 50 milhões de pessoas.



Compare isto apenas com os sobre custos a cada ano no orçamento militar. Mesmo o presidente Obama, ao assinar o orçamento do Pentágono, disse: "O Gabinete de Contabilidade do Governo (Government Accountability Office, GAO), examinou 96 dos principais projetos de defesa do ano passado e descobriu sobre custos que totalizavam US$295 mil milhões". (whitehouse.gov, Oct. 28)



Os US$50 mil milhões do esquema Ponzi de Bernard Madoff, supostamente a maior fraude da história, torna-se insignificante na comparação. Por que não há um inquérito criminal a este roubo de muitos milhares de milhões de dólares? Onde estão às audiências no Congresso ou a histeria dos media acerca dos US$296 mil milhões em sobre custos? Por que os presidentes das corporações não são levados algemados aos tribunais?



Os sobre custos são uma parte integral do subsídio militar às maiores corporações dos EUA. Eles são tratados como coisa habitual. Pouco importando o partido no governo, o orçamento do Pentágono cresce, os sobre custos crescem e a proporção dos gastos internos encolhe.



Viciado na guerra

O orçamento militar do ano é apenas o exemplo mais recente de como a economia dos EUA é mantida a flutuar por meios artificiais. Décadas de constante ressuscitar da economia capitalista através do estímulo com despesas de guerra criaram um vício de militarismo que as corporações estado-unidenses não podem dispensar. Mas ele já não é suficientemente grande para resolver o problema capitalista da superprodução.



A justificação dada para este tiro anual no braço de muitos milhares de milhões de dólares foi que ajudaria a amortecer ou evitar totalmente uma recessão capitalista e poderia diminuir o desemprego. Mas, como advertiu em 1980 Sam Marcy, fundador do Workers World Party, em "Generals Over the White House", ao longo de um período de tempo prolongado este estimulante será cada vez mais necessário. Finalmente ele transforma-se no seu oposto e torna-se um depressor maciço que adoece e apodrece toda a sociedade.



A raiz do problema é que à medida que uma tecnologia se torna mais produtiva, os trabalhadores obtêm uma parte cada vez menor do que produzem. A economia dos EUA está cada vez mais dependente do estimulante de super-lucros e dos sobre custos militares de muitos milhares de milhões de dólares para absorver uma fatia cada vez maior do que é produzido. Isto é uma parte essencial da constante redistribuição de riqueza que a afasta dos trabalhadores e a conduz aos bolsos dos super-ricos.



Segundo o Center for Arms Control and Non-Proliferation, os gastos militares dos EUA agora são significativamente maiores, em termos de dólares de 2009, do que foram durante os anos de pico da Guerra da Coréia (1952: US$604 mil milhões), da Guerra do Vietnam (1968: US$513 mil milhões) ou da acumulação militar da era Reagan na década de 1980 (1985: US$556 mil milhões). Mas isto já não é mais suficiente para manter a economia dos EUA à tona.



Mesmo forçando países ricos em petróleo dependentes dos EUA a tornarem-se devedores com infindáveis compras de armas não é possível resolver o problema. Mais de dois terços de todas as armas vendidas globalmente em 2008 foram de companhias militares dos EUA. (Reuters, Sept. 6)



Se bem que um enorme programa militar na década de 1930 tenha sido capaz de retirar a economia dos EUA de um colapso devastador, num período longo este estímulo artificial mina os processos capitalistas.



O economista Seymour Melman, em livros como "Pentagon Capitalism", "Profits without Production" e "The Permanent War Economy: American Capitalism in Decline", advertiu quanto à deterioração da economia estado-unidense e dos padrões de vida de milhões de pessoas.



Melman e outros economistas progressistas argumentaram em favor de uma "conversão econômica" racional ou da transição da produção militar para a civil por parte das indústrias militares. Eles explicaram como um bombardeiro B-! ou um submarino Trident poderia pagar os salários de milhares de professores, proporcionar escolaridade ou cuidados de dia ou reconstrução de estradas. Gráficos mostravam que o orçamento militar emprega muito menos trabalhadores do que os mesmo fundos gastos com necessidades civis.



Todas essas idéias eram boas e razoáveis, exceto que o capitalismo não é racional. No seu insaciável impulso para maximizar lucros ele opta sempre por super-lucros imediatos em relação mesmo aos melhores interesses da sua própria sobrevivência a longo prazo.



Nenhum "dividendo da paz"

As altas expectativas, após o fim da Guerra-fria e o colapso da União Soviética, de que milhares de milhões de dólares poderiam agora serem voltados para um "dividendo da paz" foram esmagadas contra o contínuo crescimento astronômico do orçamento do Pentágono. Esta sombria realidade deixou tão desmoralizados e estupefatos economistas progressistas que hoje quase nenhuma atenção é prestada à "conversão econômica" ou ao papel do militarismo na economia capitalista, ainda que ele hoje seja muito maior do que no mais altos níveis da Guerra-fria.



O subsídio militar anual de muitos milhares de milhões de dólares em que economistas burgueses confiaram desde a Grande Depressão para acelerar e começar outra vez o ciclo da expansão capitalista já não é suficiente.



Desde que as corporações se tornaram dependentes de dádivas de muitos milhares de milhões de dólares, o seu apetite tornou-se insaciável. Em 2009, num esforço para protelar um colapso da economia capitalista global, mais de US$700 milhões foram entregues aos maiores bancos. E isso foi apenas o princípio. O salvamento dos bancos está agora nos trilhões de dólares.



Mesmo US$600 a US$700 bilhões por ano em gastos militares não pode mais arrancar outra vez a economia capitalista ou gerar prosperidade. Mas a América das corporações não pode viver sem isso.



O orçamento militar cresceu tanto que agora ameaça esmagar e devorar todo o financiamento social. O seu peso absoluto está a esmagar o financiamento para toda a atividade humana. As cidades dos EUA estão em colapso. A infraestrutura de pontes, estradas, barragens, canais e túneis está a desintegrar-se. Vinte e cinco por cento da água potável dos EUA é considerada "má". O desemprego está oficialmente a atingir 10 por cento e na realidade é o dobro disso. O desemprego entre negros e latinos é de mais de 50 por cento. Catorze milhões de crianças nos EUA estão a viver em habitações abaixo do nível de pobreza.



Metade dos gastos militares está oculta

O anunciado orçamento militar de 2010 de US$680 bilhões é realmente apenas cerca da metade dos custos anuais dos EUA com despesas militares.



Estas despesas são tão grandes que há um esforço concertado para ocultar muitas despesas militares em outras rubricas orçamentais. A análise anual da War Resister League calculou as despesas militares reais de 2009 dos EUA em US$1.449 bilhões, não o orçamento oficial de US$651 bilhões. A Wikipedia, citando várias fontes, sugeriu um orçamento militar total de US$1.144 bilhões. Sem considerar de quem é a estimativa, está para além de discussão que o orçamento militar realmente excede US$1000 bilhões por ano.



O National Priorities Project , o Center for Defense Information e o Center for Arms Control and Non-Proliferation analisam e revelam muitas despesas militares ocultas enfiadas em outras partes do orçamento total dos EUA.



Os benefícios dos veteranos, por exemplo, que totalizam US$91 bilhões, não estão incluídos no orçamento do Pentágono. As pensões militares que totalizam US$48 bilhões estão cravadas no orçamento do Departamento do Tesouro. O Departamento da Energia esconde no seu orçamento US$18 bilhões dos programas de armas nucleares. Os US$38 bilhões que financiam vendas de armas ao estrangeiro estão incluídos no orçamento do Departamento de Estado. Uma das maiores rubricas ocultas é a dos juros sobre a dívida incorrida com guerras passadas, os quais totalizam entre US$237 bilhões de US$390 bilhões. Isto é realmente um subsídio sem fim para os bancos, os quais estão intimamente ligados às indústrias militares.



Espera-se que todas as partes destes orçamentos inchados cresçam entre 5 e 10 por cento ao ano, enquanto o financiamento federal para estados e cidades está a encolher de 10 a 15 por cento ao ano, levando às crises de déficits.



Segundo o Office of Management and Budget, 55 por cento do orçamento total de 2010 dos EUA irá para os militares. Mais da metade! Enquanto isso, as concessões federais aos estados e cidades para serviços humanos vitais — escolas, treino de professores, programas de cuidados familiares, almoços escolares, manutenção de infraestrutura básica para água potável, tratamento de esgotos, pontes, túneis e estradas — estão a reduzir-se.



O militarismo gera repressão

O aspecto mais perigoso do crescimento militar é a insidiosa penetração da sua influência política em todas as áreas da sociedade. Trata-se da instituição que está mais afastadas do controle popular e a mais motivada para a aventura militar e a repressão. Generais na reforma circulam nos conselhos de administração das corporações, tornando-se palradores nos media mais importantes, assim como lobistas, consultores e políticos.



Não é uma coincidência que além de ter a maior máquina militar do mundo, os EUA tenham a maior população prisional do mundo. O complexo industrial-prisional é a única indústria em crescimento. Segundo o Bureau of Justice Statistics do Departamento da Justiça dos EUA, mais de 7,3 milhões de adultos estavam sob liberdade condicional ou encarcerados em 2007. Mais de 70 por cento dos encarcerados são negros/as, latinos/as, nativos/as e outras pessoas de cor. Os adultos negros têm quatro vezes mais probabilidade de serem aprisionados do que os brancos.



Tal como entre os militares, com as suas centenas de milhares de empreiteiros e mercenários, o impulso para maximizar lucros tem levado à crescente privatização do sistema prisional.



O número de prisioneiros tem crescido implacavelmente. Hoje há 2,5 vez mais pessoas no sistema prisional do que 25 anos atrás. Na medida em que o capitalismo estado-unidense é cada vez menos capaz de proporcionar empregos, estágios profissionais ou educação, as únicas soluções apresentadas são as prisões ou os militares, descarregando a devastação sobre indivíduos, famílias e comunidades.



O peso dos militares pressiona o aparelho repressivo do estado sobre todas as partes da sociedade. Há um enorme crescimento de polícias de toda espécie e incontáveis agências de polícia e de inteligência.



O orçamento para 16 agências de espionagem dos EUA atingiu os US$49,8 bilhões no ano fiscal de 2009; 80 por cento destas agências secretas são braços do Pentágono (Associated Press, Oct. 30). Em 1998 esta despesa era de US$26,7 bilhões. Mas estas agências secretas de topo não estão incluídas no orçamento militar. Nem tão pouco as agências de repressão à imigração e de controle de fronteiras.



As forças armadas dos EUA estão estacionadas em mais de 820 instalações militares por todo o mundo. Isto não conta as bases arrendadas e os postos secretos de escuta e muitas centenas de navios e submarinos.



Mas quanto mais a máquina militar cresce, menos pode controlar o seu império mundial porque não apresenta soluções e nem melhorias em padrões de vida. As armas de alta tecnologia do Pentágono podem ler uma matrícula de automóvel num carro a partir de um satélite de vigilância; os seus binóculos de visão noturna pode devassar a escuridão; e os seus aviões sem piloto (drones) podem incinerar uma aldeia isolada. Mas eles são incapazes de proporcionar água potável, escolas ou estabilidade às nações atacadas.





Apesar de todas as fantásticas armas de alta tecnologia do Pentágono, a posição geopolítica dos EUA está a decair ano após ano. Sem qualquer conexão com o seu poder de fogo maciço e o seu armamento no estado-da-arte, o imperialismo americano tem sido incapaz de reconquistar os mercados mundiais e a posição do capital financeiro estado-unidense. A sua economia e as suas indústrias têm sido tolhidas pelo peso absoluto da manutenção da sua máquina militar. E como tem mostrado a resistência no Iraque e no Afeganistão, esta máquina não pode igualar a determinação do povo para controlar o seu próprio futuro.





Como a imensa economia capitalista estado-unidense é capaz de oferecer cada vez menos aos trabalhadores dos EUA, este nível de resistência determinada certamente também aqui fincará raízes.



O original encontra-se em http://www.workers.org/2009/us/pentagon_1112/

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

García sobe o tom com o Chile e eleva tensão

Após denunciar caso de espionagem, líder peruano diz que o país vizinho é 'republiqueta'; Bachelet reage

João Paulo Charleaux e Ruth Costas



O presidente peruano, Alan García, qualificou o Chile de "republiqueta" na madrugada de ontem, contribuindo para criar um novo foco de tensão na América Latina. As relações entre os dois países já andavam estremecidas havia meses, mas azedaram de vez no fim de semana, quando García acusou o Chile de cooptar um militar peruano para espionar para o seu governo. "Esses são atos repulsivos, que não correspondem aos de um país democrático e deixam mal a presidência do Chile", disse García. "São próprios de uma republiqueta."

A presidente chilena, Michelle Bachelet, reagiu: "As acusações, que eu considero ofensivas, não contribuem para a cooperação e a integração entre os dois países."

Pouco depois, o chanceler peruano, José Antonio García Belaúnde, anunciou que as provas do ato de espionagem seriam entregues para Santiago. "Estamos num ponto delicado das relações (com o Chile)", admitiu. Às vésperas da eleição do dia 13, a oposição chilena pede o rompimento com o Peru.

De acordo com Lima, o suboficial da Força Aérea Víctor Ariza foi recrutado pelo Chile sete anos atrás e recebia US$ 3 mil mensais para repassar informações relativas ao arsenal, os planos de contingência e a identidade dos alunos da escola de inteligência da Aeronáutica peruana. As provas do esquema estariam no computador de Ariza e em documentos encontrados com ele.

Em agosto, García já tinha denunciado um acordo secreto entre o Chile e a Bolívia, que daria saída para o mar para os bolivianos, mas prejudicaria os interesses de Lima. Além disso, em duas ocasiões, em 2008, o Chile disse ter sido vítima de espionagem dos peruanos. Na mais grave, funcionários da embaixada chilena em Lima tiveram seus e-mails vasculhados por um hacker, supostamente a serviço da inteligência do Peru.

O aumento da desconfiança entre os dois países teria, segundo analistas chilenos e peruanos ouvidos pelo Estado, três motivações.

A primeira é o processo movido por Lima contra Santiago na Corte Internacional de Justiça da ONU, em Haia. O Peru reivindica do Chile uma área de 95 km² no Oceano Pacífico.

"Por isso, tenta dar visibilidade a sua demanda e mostrar-se agredido, na esperança de receber uma decisão favorável", disse Mladen Yopo, subdiretor da Academia Nacional de Estudos Políticos e Estratégicos do Ministério da Defesa do Chile.

"García parte da hipótese de que a Corte lhe dará razão e o Chile não acatará a decisão. Por isso, seria necessário aumentar a força militar peruana e controlar o crescimento da chilena pela pressão da opinião pública regional e global", opina José Rodríguez Elizondo, professor de direito da Universidade do Chile, em Santiago.

O segundo motivo é a compra de armamentos dos militares chilenos - como a recente encomenda feita aos EUA de US$ 665 milhões em mísseis Stinger de médio alcance e em um novo sistema de radares.

O Peru diz que as compras chilenas extrapolam os parâmetros da "dissuasão" e "projeção de força".

"Nos anos 70, chilenos e peruanos gastavam quase o mesmo em defesa", diz Farid Kahhat, cientista político da Universidade Católica do Peru. "De lá para cá, os gastos do Peru permaneceram quase estáveis. Os do Chile aumentaram três vezes e não há perspectiva de reversão desse processo, já que a Lei do Cobre destina 10% das exportações deste produto para as Forças Armadas."



ECONOMIAS ASSIMÉTRICAS

O último fator que impulsionaria a tensão entre os dois países é a assimetria nas relações econômicas.

Segundo Kahhat, hoje há US$ 7 bilhões em investimentos chilenos no Peru e só US$ 1 bilhão em investimentos peruanos no Chile.

"Já há uma rivalidade histórica entre os dois países por causa da Guerra do Pacífico (mais informações nesta página). Agora, esse aumento da presença chilena é vista como uma nova ameaça no Peru", diz. Segundo pesquisas recentes citadas pelo analista, 74% dos peruanos veem os investimentos estrangeiros no país com bons olhos. Quando o capital é chileno, o índice cai para 41%.



ACUSAÇÕES

Alan García

Presidente do Peru

"Esses são atos repulsivos, que não correspondem a um país democrático. São atos próprios de uma republiqueta"



Michelle Bachelet

Presidente do Chile

"São acusações ofensivas que em nada contribuem para a cooperação e integração. O que deve primar é o respeito e a responsabilidade das autoridades"





Região sofre com velhas disputas



Além da Guerra do Pacífico, que transformou em inimigos Peru, Chile e Bolívia, outros conflitos mantêm a região em constante crise. Quito e Bogotá romperam no ano passado, quando a Colômbia bombardeou um acampamento das Farc no Equador.

Recentemente, a Venezuela acusou a Colômbia de querer levar os dois países à guerra. Caracas também reivindica parte do território da Guiana, que tem um problema semelhante com o Suriname. A Nicarágua vive às turras com Honduras, por causa da fronteira marítima; com a Costa Rica, em razão de um tratado de limites mal feito; e até com a Colômbia, pela posse do arquipélago de San Andrés.

A disputa entre Argentina e Grã-Bretanha pela soberania das Malvinas levou ambos à guerra, em 1982, e também atormenta a diplomacia regional.





Atritos tiveram início há 130 anos

João Paulo Charleaux



Por trás do duro discurso feito ontem pelo presidente peruano, Alan García, há 130 anos de ressentimentos e desconfiança. Chile, Peru e Bolívia enfrentaram-se entre 1879 e 1884 na Guerra do Pacífico, que terminou com os chilenos anexando parte do território peruano e bloqueando a saída da Bolívia para o mar - duas feridas nunca cicatrizadas. A herança de litígios fronteiriços começa no Deserto do Atacama e avança pelo Oceano Pacífico, em uma área de aproximadamente 95 quilômetros quadrados.

O problema é que qualquer solução que seja negociada entre Chile e Peru continuará impedindo que os bolivianos voltem a ter acesso ao Pacífico. Da mesma maneira, qualquer acordo entre Chile e Bolívia inviabilizará a demanda original peruana pela ampliação de seu mar territorial. Diante do impasse, o Chile armou-se, priorizando a compra de fragatas e submarinos. A Bolívia deu sinais de que poderia aceitar a simples abertura de um corredor de acesso ao Pacífico. E o Peru levou o caso à Corte Internacional de Justiça da ONU.

"A primeira etapa da estratégia peruana foi jurídica e terminou com a instalação do processo na Corte Internacional de Justiça, em Haia, em janeiro do ano passado. Agora, estamos vendo uma segunda etapa, na qual os principais componentes são de cunho comunicacional e militar", disse ao "Estado" José Rodríguez Elizondo, ex-embaixador chileno que esteve exilado no Peru por dez anos e se dedicou ao estudo do conflito sobre a fronteira marítima.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

O que é a Teoria dos Jogos?

Se um grupo de pessoas que jantam juntas num restaurante divide a conta por igual, é quase certo que o total gasto será maior do que se cada um pagasse a parte que consumiu.

No auge da Guerra Fria entre Estados Unidos e União Soviética, ter mais armas nucleares era uma atitude em prol da paz, não da guerra.

Na hora de ir para casa, de carro, optar pelo caminho mais longo pode significar chegar mais cedo.

Essas três afirmações são típicas da Teoria dos Jogos. Todas se referem a situações estratégicas em que, para tomar a melhor decisão, o indivíduo (ou grupo) precisa levar em consideração as decisões dos outros. Essas situações são chamadas de jogos porque as ações dos demais participantes nos afetam.

Eis a lógica em cada exemplo. No restaurante, cada indivíduo, sabendo que a conta será dividida, não tem incentivo para economizar. Por que pedir o prato mais barato se eu vou ter de dividir o preço do prato caro dos outros? Assim, no final, a conta fica mais cara.

Quanto às armas nucleares, a lógica é a seguinte. Cada uma das superpotências tinha capacidade de destruir a outra. Ambas sabiam, então, que uma guerra não teria vencedores. Numa situação assim, o esforço para evitar o conflito direto é maior do que quando um dos lados acredita que pode ganhar a guerra.

No trânsito, você sabe que pegar a avenida principal é o caminho mais rápido. Só que ele é mais rápido para todo mundo. Por isso, no fim do expediente, ele fica lotado – e o trânsito se torna lento. Pegar ruas menores, menos conhecidas, é melhor.

A Teoria dos Jogos foi inventada pelo matemático húngaro americano John von Neumann e pelo economista austríaco Oskar Morgenstern, em 1944. Nas décadas seguintes, ela foi desenvolvida e passou a ser aplicada em áreas tão díspares como biologia, economia, engenharia, ciências políticas, relações internacionais e filosofia. Oito teóricos ganharam o Nobel por avanços na Teoria dos Jogos, incluindo John Nash (cuja vida é retratada no filme Uma mente brilhante, com Russell Crowe).

Embora a formulação matemática seja recente, as questões da Teoria dos Jogos são muito antigas. O filósofo grego Sócrates, no século V a.C., já propunha um dilema típico da Teoria dos Jogos. Dizia que um soldado em batalha, sob ataque das tropas inimigas, tinha diante de si uma questão. Se o destino quisesse que seu lado saísse vitorioso, a contribuição dele na luta seria provavelmente irrisória. Então, para que correr o risco de morrer? Se, por outro lado, a vitória fosse pertencer ao inimigo, mais razão ainda haveria para ele fugir da batalha. Em qualquer hipótese, portanto, a decisão racional para cada indivíduo seria fugir. Mas, se todos pensassem assim, a derrota seria certa.

Uma solução curiosa para o dilema foi oferecida pelo conquistador espanhol Hernán Cortez. Ao desembarcar no México, para lutar contra o império asteca, Cortez previu que seus soldados poderiam pensar em fugir. Então queimou todos os navios. Curiosamente, sua ação teve efeito também sobre os astecas. Eles imaginaram que alguém capaz de queimar sua possibilidade de fuga devia ter alguma razão para tamanha confiança. Assim, bateram em retirada. E Cortez venceu a batalha sem perder um só homem.

domingo, 15 de novembro de 2009

Cheiro de pólvora

Os antigos romanos defendiam a ideia de que, para garantir a paz, deveriam estar preparados para a guerra (si vis pacem, para bellum). Os governos latino-americanos estão cumprindo a frase à risca, sobretudo o presidente venezuelano, Hugo Chávez, que esta semana provocou um embate de palavras, com direito a reclamações da Colômbia perante a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização dos Estados Americanos (OEA). Depois de convidar o povo às armas, Chávez emendou o discurso. “Nós, militares venezuelanos, somos pacifistas e nos preparamos para a guerra para assegurar a paz”, afirmou. As declarações foram recebidas pelo presidente colombiano, Álvaro Uribe, como uma mensagem de “tranquilidade”.

No entanto, desde que os colombianos anunciaram em julho o acordo de receber tropas norte-americanas em sete bases militares de seu território, a tensão na fronteira entre Venezuela e Colômbia só tem aumentado. Chávez declarou publicamente que “os Estados Unidos anexaram a Colômbia com o tratado”. “Os EUA atuarão, a partir do acordo militar que assinaram com a Colômbia, como o personagem de ficção James Bond, ‘Agente 007’, com permissão para ‘matar quem quiser, aonde quiser’”, insinuou na sexta-feira.

Preocupado com a vizinhança, o governo peruano de Alan Garcia vai propor a redução nos gastos com armamento no próximo encontro com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em Lima, 11 de dezembro. Em visita a Brasília e São Paulo, o ministro de Transportes e Comunicações do Peru, Enrique Cornejo, adiantou na semana passada o projeto por escrito a Lula, ao chanceler, Celso Amorim, e a representantes do Congresso. A ideia é que todos os países da União de Nações Sul-Americanas (Unasul) assinem um Protocolo de Paz, Segurança e Cooperação.

“Garcia fez um cálculo de que se reduzisse em 3% os gastos que já existem na América do Sul em armamento nos próximos cinco anos e em 15% os gastos em novas armas, permitiria liberar recursos para que 10 milhões de sul-americanos saiam da pobreza”, disse Cornejo ao Correio. “Gastamos em 2008 US$ 24 bilhões (em armas), 50% mais do que gastávamos os mesmos países 10 anos atrás”. O Instituto de Estudos para a Paz de Estocolmo (Sipri, pela sigla em inglês) estima que o investimento militar total foi de US$ 47 bilhões no ano passado.



Intervenção

O ministro peruano revela que o protocolo incluiria a criação de uma força sul-americana de intervenção, uma “espécie de capacetes azuis”. Para Cornejo, se houvesse tal instrumento, talvez a Colômbia não tivesse sentido a necessidade de buscar apoio das tropas norte-americanas. “Se existisse uma força de intervenção sul-americana, com temas vinculados ao narcotráfico e ações subversivas, teríamos um instrumento muito concreto para intervir no marco regional dos interesses sul-americanos, com o desejo de cooperação e integração”, completou.

Cornejo admite que algumas despesas são necessárias para renovar o equipamento e garantir a vigilância das fronteiras contra atividade ilegais. “O que fica claro é que os inimigos não são os países da América do Sul entre si. Se algum esforço de equipamento está sendo feito tem a ver com elementos de segurança, que vão justamente a inimigos como o narcotráfico, o crime organizado e o terrorismo”, diz Cornejo.

Com apenas US$ 71,8 milhões em gastos militares, o presidente paraguaio, Fernando Lugo já manifestou interesse na proposta peruana. Já o presidente da Bolívia, Evo Morales, quer organizar uma reunião de emergência da Aliança Bolivariana para os Povos da América (Alba). A intenção do encontro é analisar a crise entre Venezuela e Colômbia e definir uma doutrina militar “nacionalista e revolucionária” para a região. Ele repudiou o acordo Colômbia-EUA e o classificou como “uma aberta provocação à América Latina”. “Posso chegar à conclusão de que os Estados Unidos fomentam o terrorismo e o narcotráfico na Colômbia para justificar que esse país seja a base para agredir nossos povos”, disse o presidente boliviano.

Os presidentes Chávez e Uribe terão duas chances para conversar frente a frente antes do fim do mês. O colega Luiz Inácio Lula da Silva espera que os dois líderes compareçam à reunião de países amazônicos, em 26 de novembro, em Manaus. O objetivo do encontro é definir posições conjuntas para a Conferência do Clima no fim do ano, em Copenhague, que deve anunciar um pacto pós-Kyoto. No entanto, o mandatário brasileiro espera que os vizinhos aproveitem a oportunidade para resolver suas diferenças. Chávez e Uribe também devem participar da próxima Cúpula Iberoamericana, marcada para o próximo dia 29, em Estoril (Portugal).

“Nós, militares venezuelanos, somos pacifistas e nos preparamos para a guerra para assegurar a paz“

Hugo Chávez, presidente da Venezuela

“Não fiz nem farei um único gesto de guerra à comunidade internacional, muito menos a países irmãos“

Álvaro Uribe, presidente da Colômbia



Conflito envolveria milícias e petróleo

Especialistas acham improvável uma guerra entre Venezuela e Colômbia. No caso de um conflito armado, a revista colombiana Cambio, avalia que as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), reconhecidas pela Venezuela como beligerantes, formariam um governo solidário ao presidente Hugo Chávez. O governante venezuelano também receberia o apoio da Aliança Bolivariana para os Povos da América (Alba), que possui um acordo de assistência militar entre países como Equador, Bolívia e Nicarágua.

Os dois países são grandes investidores em estratégia militar. Chávez criou a Especialização em Simulação de Jogos no Instituto de Altos Estudos da Defesa Nacional. Se houvesse confronto, o general Raúl Isaías Baduel prevê que a estratégia seria “de guerra assimétrica”, sem restrições de técnicas militares, e com a inclusão das milícias bolivarianas, além das Forças Armadas. O plano acrescentaria, em último caso, a chamada “guerra do petróleo” — o bloqueio de fornecimento de combustível aos EUA. Já o governo de Álvaro Uribe criou o Sistema Digital de Instrução (SDI) das Forças Militares, para a Escola Militar de Cadetes, e atualizou o Centro de Simulação e Análise de Crise da Escola Superior de Guerra em 2007.

Quanto ao número de efetivos do Exército, a Venezuela é sete vezes inferior à Colômbia, com apenas 34 mil homens. Por essa razão, supõe-se que o governo de Chávez impulsionou sua corrida armamentista a partir de 2004, com a compra de 53 helicópteros de transporte e ataque, 24 aviões de combate Sukhoi, um sistema antiaéreo M1-Tor, mísseis russos de longo alcance SS-300, e 100 mil fuzis de assalto AK103 — além de duas fábricas para sua construção. A conta com a Rússia já totalizou US$ 5 bilhões e Chávez planeja gastar mais US$ 2 bilhões em 92 tanques, 300 carros blindados e mísseis antiaéreos.

Se a Venezuela é mais poderosa no ar, a Colômbia bate o país vizinho em infantaria e em 50 anos de experiência de combate contra as Farc. Os colombianos investem em mobilidade, ao modernizar a frota de helicópteros de transporte. Uribe adquiriu 13 aviões Kfir de Israel, reformou 11 do mesmo tipo, e comprou 25 aviões Super Tucano da brasileira Embraer. Se isso não bastasse para fazer Chávez desistir de uma guerra, a Colômbia possui uma aliança estratégica com a potência militar mundial, os Estados Unidos. (VV)



segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Pirata virtual troca senha em órgão federal e exige US$ 350 mil

Sob constante ataque de criminosos, as cerca de 320 redes de computadores do governo federal – entre elas sistemas do porte do Banco do Brasil e o Serviço de Processamento (Serpro), que cuida do coração da economia e do mercado financeiro – geraram uma nova demanda para os órgãos segurança e de inteligência. Um inquérito que corre em segredo na Polícia Federal, em Brasília, investiga a atuação de uma quadrilha internacional que penetrou no servidor de uma estatal, destruiu os controles, trocou a senha e, depois de paralisar todas as atividades da empresa, exigiu um resgate de US$ 350 mil.

A ocorrência veio à tona durante depoimento do diretor de Segurança da Informação e Comunicação do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República, Raphael Mandarino Júnior, num debate sobre terrorismo, na Comissão de Segurança da Câmara. Versão moderna do delito de “extorsão mediante sequestro”, a invasão foi praticada, segundo ele, por uma quadrilha estabelecida em um país do Leste Europeu que exigia um depósito no valor do pedido de resgate para devolver a senha modificada.

Embora a Abin tenha desenvolvido um dos centros de proteção contra crimes cibernéticos mais modernos do mundo, a ocorrência revelou o quanto é vulnerável a rede oficial de computadores. Os registros da própria Abin mostram que no ano passado apenas uma das grandes redes do governo – do porte do Banco Central – sofreu 3,8 milhões ataques, o que representa, na média, 2 mil tentativas de invasão por hora.

O crescimento do crime no Brasil – foram 700 prisões nos últimos quatro anos – levou a Polícia Federal a criar a Coordenação de Repressão a Crimes Cibernéticos, que instalará, até janeiro do ano que vem, unidades em todos os estados do país. Cerca de 200 policiais estão sendo treinados para atuar no setor. Num aparente paradoxo, a alta incidência de ataques significa também que o Brasil está entre os mais avançados em tecnologia da informação.

Os sistemas desenvolvolvidos na Abin renderam ao Brasil um espaço junto à Organização dos Estados Americanos (OEA) para gerenciar programas de segurança e dar respostas às ações de terrorismo cibernético. Mandarino Júnior diz que nos últimos quatro anos a Abin treinou e instalou centros de resposta aos ataques em 25 países da América Latina, alguns deles vizinhos. O Brasil não é alvo de ações terroristas, mas na era da globalização virtual e, portanto, sem fronteiras não está totalmente imune.

– Alguns de nossos servidores já abrigaram sites de captação e troca de informações sobre terrorismo – diz o diretor da Abin.

O verdadeiro legado de 1989

A Cortina de Ferro começou a se desintegrar muito antes da derrubada do Muro de Berlim em novembro de 1989. De fato, o sistema comunista na Europa Oriental já estava em decadência terminal há vários anos.

Os regimes totalitários de partido único sufocavam os direitos humanos e as liberdades políticas, e não mostravam resultados no quesito considerado como a própria essência do comunismo: a boa performance econômica. As disparidades entre as Europas Oriental e Ocidental aumentaram na década de 80, especialmente após a integração dos mercados da Europa Ocidental, o que acelerou o progresso naquela região.

O Pacto de Varsóvia capitaneado pela União Soviética não se mostrou como uma alternativa viável para a integração do continente.

Manifestações anticomunistas abalavam a região periodicamente e, no verão de 1980, um furacão fez a Europa tremer: o surgimento de um sindicato livre na Polônia, o Solidariedade. Embora o Solidariedade tenha sido coagido e forçado a se tornar um movimento clandestino, a adesão massiva dos poloneses ao grupo e à sua liderança visionária demonstrava que os dias do comunismo imposto pelo bloco soviético estavam contados. A única incerteza era se o sistema desapareceria com um estrondo ou apenas com um suspiro.

Felizmente, o comunismo não tinha mais forças para resistir ao seu próprio fim. Ideologicamente falido, economicamente incompetente e politicamente primitivo, o marxismo-leninismo revelou-se mais uma experiência fracassada.

Além disso, o regime soviético, que havia erguido governos coligados por toda a Europa Oriental, já não tinha a convicção ou os recursos para reprimir, à força, o anseio dos povos pelo pluralismo e pela independência das nações do bloco.

No dia em que o muro foi efetivamente derrubado, a Polônia já tinha um governo democraticamente eleito, enquanto Hungria e Tchecoslováquia estavam caminhando rapidamente em direção ao pluralismo político, conduzidas por líderes que perceberam que a mudança do regime era inevitável.

De um modo geral, as pessoas se esquecem que, embora os acontecimentos históricos de novembro de 1989 tenham simbolizado o colapso do comunismo, os eventos também anunciavam a libertação dos Estados do Leste Europeu da soberania soviética.

Enquanto hoje o comunismo é apenas um pesadelo cada vez mais longínquo nessas nações, a preocupação em manter a independência nacional contra um governo russo cada vez mais ameaçador continua.

De fato, autoridades em Moscou ainda buscam redefinir o significado de 1989. Negam, por exemplo, que a União Soviética ocupava metade da Europa depois da Segunda Guerra Mundial e minimizam o fato de que foi pela força de suas armas que impuseram ali um sistema repressivo e totalitário, que sufocou o progresso econômico e político durante quase meio século.

Alguns porta-vozes da Rússia alegam que o Kremlin desmantelou o bloco soviético por pura benevolência sua e que a Guerra Fria terminou com um empate, em vez de admitirem que o sistema soviético foi um fracasso e que se desintegrou de dentro para fora.

Infelizmente, essa ideia de um sistema soviético benigno ou até mesmo progressivo é oferecida para justificar a influência russa, atual e futura, junto aos antigos países do bloco. Por este motivo, tanto os europeus como os americanos precisam defender vigilantemente o verdadeiro legado histórico de novembro de 1989.

Janusz Bugajski é diretor do Centro para Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS), em Washington

sábado, 7 de novembro de 2009

Mudanças são positivas, afirmam especialistas

Dois especialistas em defesa ouvidos pelo Estado consideraram positiva, de uma forma geral, a proposta de novo texto para a Lei Complementar 97. Tanto Márcio Scalércio, da Pontifícia Universidade Católica do Rio (PUC-RJ), como Clóvis Brigagão, da Universidade Cândido Mendes (Ucam), elogiaram a doutrina de integração operacional, com a constituição de um Estado-Maior Conjunto e a possibilidade de padronização de equipamentos, mas se dividiram em relação a outros aspectos. Brigagão criticou a possibilidade de uso de corporações militares para trabalho de polícia e Scalércio alertou para a possibilidade de resistência de setores militares às mudanças.

"Não vejo especificamente nada de negativo na proposta, mas acho que militares vão criar um monte de problemas", disse Scalércio. "Muitos ainda resistem à liderança civil. Também atrapalham muito esse debate alguns militares da reserva, que são influentes e conservadores, embora haja exceções. A FAB vai chiar contra a proposta de sair da aviação civil, eles acham que é deles. Tudo que afetar áreas que os militares dominam será objeto de resistências."

Ele afirmou que é "obsoleta" a concepção, ainda vigente no Brasil, que separa Marinha, Exército e Aeronáutica. "Este Estado-Maior Conjunto é positivo. Hoje, o Estado-Maior da Defesa é só burocrático." E explicou que os EUA, por exemplo, operam Forças Armadas conjuntamente, assim como Israel.

"A separação se mantém, mas as operações são conjuntas. O rádio serve às três Forças, que podem se comunicar entre si. O equipamento é mais compartilhado, o blindado do Exército é o mesmo da Marinha, excetuando os carros anfíbios."

Scalércio não vê problemas na concessão de poder de polícia aos militares e lembra que há limites constitucionais para o uso das Forças Armadas contra o crime. Brigagão, porém, condena a ideia. "Não acho correto", disse. "Marinha, Exército e Aeronáutica são forças de defesa. Devem olhar para fora. Para dentro, é polícia, é lei."

O professor da Ucam elogiou, contudo, a proposta de reestruturar o Ministério da Defesa. "O ministério tem sido, até agora, uma agência corporativa das Forças Armadas, não um Ministério da Defesa como nós, que estudamos o setor, entendemos que deve ser. Atualmente, não há uma carreira civil e não há participação civil no Ministério da Defesa." Brigagão também elogiou a proposta de criar o Estado-Maior Conjunto, mas pediu a constituição de uma política de defesa, que, em sua opinião, não existe.

"Tenho insistido que não há uma política integrada de defesa, que conceba estrategicamente a defesa", afirmou. "Exército, Marinha e Aeronáutica têm, cada um, a sua política. E a ausência de debate do Congresso Brasileiro é lamentável."

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Turbulência nas margens plácidas

CARLOS PEREIRA DA SILVA GAMA

Mestre e doutorando em relações internacionais pela PUC (RJ), é professor de relações internacionais da PUC (RJ)

LUIZ FELDIMAN

Mestre em Relações internacionais pela PUC (RJ)

Que análise fazer de Honduras em plena queda? Na crise que corre, dois espaços identitários bem demarcados pela territorialidade moderna— o interior da embaixada, brasileiro, e seu exterior, a jurisdição hondurenha — deixam de estar em conjunção política, resultando numa dupla desordem que torna ambígua a fronteira entre dentro e fora.

O equilíbrio perdido, o nexo entre esses dois sistemas políticos, atendia por predicados simples. Extramuros, um Estado de Direito contraposto a longo histórico de governos militares. Intramuros, a imunidade da representação diplomática de um país com longa folha de serviços à causa da articulação de consensos. Sobrevinda a crise, acusa-se em geral desrespeito a princípios constitucionais lá (alternância de poder) e aqui (não intervenção), com a nota picante da onipresente influência do presidente Chávez. Este artigo enfoca as desordens por outro ângulo.

Começando pelo exterior, note-se que o apoio brasileiro ao presidente Zelaya é o apoio de um regime democrático ao representante de outro, deposto. Vem-se chamando a atenção apropriadamente, na tradição ocidental, para o fato de que Zelaya, mais que arbitrariamente expatriado, foi privado do constitucional e inviolável direito de defesa no processo (?) que determinou seu (suposto) desrespeito pela Constituição. Do império da lei, com efeito, não se teve notícia na ação dos — por isso mesmo — golpistas.

Micheletti e os seus tiveram presente, decerto, a necessidade de se apresentarem como respeitadores das instituições, dado que um princípio de legitimidade nas relações internacionais contemporâneas é a forma de governo democrático. Mas isso não eclipsa o vicioso ato de exceção na origem de seu regime de facto, o qual é reforçado pelo cometimento de violências como as verificadas antes e durante o estado de sítio recente e também durante o abusivo e ainda não desfeito cerco à embaixada brasileira.

Passando à reação do Brasil, o contraste de suas diretrizes atuais com três notórias posições que tomou no passado é esclarecedor. A primeira diz respeito à Guerra do Paraguai (1865-1870) — nas palavras de Joaquim Nabuco, o Império escravocrata ironicamente tomava a si o partido da liberdade dos paraguaios contra a tirania de Solano López. A segunda foi a adesão do autoritário Estado Novo às Nações Unidas na causa democrática contra o Eixo nazifascista na Segunda Guerra Mundial (1942). A terceira, não menos irônica, foi o pronto reconhecimento da independência de Angola comunista (1975) pela ditadura de direita do general Ernesto Geisel. Tais ironias, ao que parece, não se apresentam no caso atual.

Muito se tem dito sobre a capacidade de o Brasil corresponder ao protagonismo que se espera de uma potência regional, ou mesmo de um membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Desde que postulou sua candidatura a esse órgão, em 1994, o Brasil apresenta a credencial de ser uma fonte de estabilidade em seu continente. Tal estabilidade, diga-se, não se irradiaria sem a execução de um papel ativo em crises, sem a conjugação de um princípio de não indiferença ao de não intervenção. Essa conjugação, condizente com o Protocolo de Ushuaia de 1998, pressupõe que a estabilidade regional se funde no aludido princípio sistêmico de legitimidade: a ordem democrática.

Quaisquer que fossem as ulteriores intenções de Zelaya com a proposta de uma constituinte, a configuração de um golpe em Honduras faz ponderar cobranças de um perfil necessariamente baixo de nossa diplomacia no caso. Ao mesmo tempo em que — responsavelmente — chama por moderação nas palavras do presidente deposto hospedado em sua embaixada, o Brasil caminha sobre terreno ambíguo. De um lado, o ambiente íntimo e estável do abrigo, salvaguardado pela projeção simbólica da soberania pátria. De outro, o lócus incômodo, circundante, da terra que experimenta turbulências que os brasileiros deixaram no passado.

Defendendo um dos valores basilares do sistema interamericano, o Brasil tem a possibilidade de renegociar seu futuro como potência regional contra o pano de fundo de um hermano convulsionado. Que em outros casos a atual chancelaria não manifeste semelhante assertividade e preferência prática pela democracia tem dado a seus críticos o tema da seletividade, mas não o de uma incoerência profunda com as normas a favor da democracia. Pelo contrário: se guarda algum valor, a posição adotada com relação ao país da América Central é meritória justamente pela defesa do Estado de Direito.