´´Observe as tendências mas não Siga a maioria`` Thiago Prado


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terça-feira, 25 de agosto de 2009

Adeus ao Estado laico

"Dai pois a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus" Marcos:12:17

Os gregos inventaram a política e foram os pais da democracia. O sucesso da política estava no comprometimento do grego com os direitos e deveres do Estado. Os cidadãos participavam ativamente das decisões e tinham, claramente, a consciência da separação entre as coisas do Estado e a vida privada.

O discurso religioso, que legitimou a fase mitológica grega, cedeu lugar ao discurso racional, voltado, exclusivamente, às necessidades materiais da sociedade. As leis eram aplicadas por magistrados que fundamentavam suas decisões no direito e não nos oráculos divinos. Destarte, da nítida separação entre religião, vida privada e política, adveio a ideia de Estado laico. Porém, quando a decadência da democracia grega se fez sentir, mormente no fim do século IV a.C., os novos líderes associaram os cargos públicos aos cultos religiosos e as funções clássicas do Estado passaram a ser confundidas com a amizade pessoal e com interesses de grupos ou facções.

Em síntese, como afirma M.I. Finley: "A política desaparecera; não havia legado da cidade-estado como organismo político, no mundo grego pós-Alexandre."

A herança grega muito nos ensina. Em primeiro lugar, religião e política não se confundem. Não se quer advogar uma ideologia que defenda a dicotomia política/religião.

O fiel é aquele que acredita no seu destino como escolhido por Deus, mas, também, luta pela transformação da sociedade, participando de associações de moradores, de partidos políticos, ou simplesmente exercendo o direito de voto. Contudo, o crente deve separar a sua religiosidade dos destinos terrenos do Estado. Em segundo lugar, a participação na vida política é impessoal.

Os líderes políticos não podem utilizar-se da fé para alcançar seus desígnios, fazendo da religião um discurso mediador da política. Aquele que invoca a Deus como senhor de seu projeto político e manipula os crentes, infundindo-lhes o proselitismo eleitoral, assume, unicamente, uma estratégia personalista. Afirmar que a vontade de Deus é que guiará o seu destino como político é forjar a despolitização, transformando a religião em instrumento a serviço de uma missão puramente pessoal.

Em terceiro lugar, a politização da religião destrói o ideal de um Estado laico, concebido para respeitar o pluralismo em sociedade, sem qualquer vinculação a grupos religiosos. O político messiânico, ao incorporar a religião como ideologia partidária, cultiva a formação de guetos, inspira o fanatismo e aniquila a possibilidade da construção de uma consciência cívica. Em consequência, a política deixa de ser a expressão da cidadania participativa e passa a figurar como vocação pessoal, que nasce do carisma do líder. Assim, a associação da política com a religião se transforma numa âncora de uma ideologia narcisista e populista, infundindo falsamente no crente a ideia de que a sua fé está irremediavelmente condicionada aos apelos do pseudoprofeta, investido de político.

A Igreja Universal é um típico exemplo desse modelo de banalização da espiritualidade, pois não é somente uma seita religiosa. É uma agremiação partidário-religiosa que utiliza a religião como meio para consolidar o seu poder político (fim), além daqueles espaços de poder que já conquistou nas áreas empresariais de comunicação, como rádio e TV. Os seguidores da Igreja Universal obedecem sem questionar às ordens políticas dos "líderes religiosos" e são incapazes de votar em outro candidato que não seja aquele escolhido e ungido pela cúpula da Igreja. O método usado pela Igreja Universal despreza qualquer ideologia partidária: o importante é transformar fé em votos e ganhar as eleições. Nesse sentido, estamos vivendo um momento em que religião e política se fundem num propósito exclusivamente eleitoral.

Adeus Estado laico... Finalmente, quem acredita em Deus com decência e honestidade sabe que a pior alienação é a banalização da espiritualidade, com a utilização da religião como meio para se alcançar um determinado fim político-partidário.

Manoel Messias Peixinho, teólogo, doutor em direito constitucional e professor de Direito da PUC-RIO.

E-mail: mm.peixinho@uol.com.br


OBS: Igrejas à parte, ele esqueceu de lembrar da história católica

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

CIA contratou Blackwater para ataque à al-Qaeda

Cheney pedira que Congresso não fosse informado do programa

Gilberto Scofield Jr.

WASHINGTON. Durante o governo do presidente George W. Bush, a empresa privada de serviços paramilitares Blackwater foi contratada em 2004 pela Agência Central de Inteligência dos EUA (CIA) como parte de um programa secreto que buscava localizar e assassinar líderes da al-Qaeda, segundo reportagem do jornal "The New York Times". Apesar dos milhões de dólares gastos, ninguém foi preso ou morto - e a empresa passou a se chamar Xe Services após matar 17 civis no Iraque numa operação a serviço dos EUA, há cerca de dois anos.

Foi por esta razão - o uso de uma empresa privada em missões de inteligência na guerra no Iraque, sem sucesso - que o atual diretor da CIA, Leon Panetta, convocou em junho, em caráter de emergência, membros das Comissões de Inteligência da Câmara e do Senado para informá-los de que uma operação secreta de assassinato de jihadistas fora cancelada. Panetta afirmou que, em 2002, quando o programa começou a ser formulado, o então vice-presidente Dick Cheney pedira à agência que não informasse ao Congresso.

Programa teria sido cancelado por falta de êxito

Não se sabe com clareza se a empresa seria escalada para participar diretamente das missões de busca e assassinato de líderes da al-Qaeda, mas seus homens estiveram envolvidos no planejamento, treinamento e supervisão das missões.

Com o recesso do Congresso, a negativa da Xe Services de comentar o assunto, e o governo envolvido no debate para a aprovação da reforma da Saúde, coube apenas ao porta-voz da CIA, Paul Gimigliano, confirmar que o programa fora cancelado por sua falta de êxito.

A Blackwater pertence a Erik Prince, herdeiro de uma família milionária da Carolina do Norte que serviu nos Navy Seals, uma força de elite da Marinha para operações de guerra. Sua passagem pelo grupo rendeu contatos importantes no Pentágono e fez da Blackwater uma das maiores empresas privadas envolvidas na guerra ao terror de Bush.

Ontem, durante palestra no Clube de Imprensa Estrangeira, o ex-diretor da CIA Michael Hayden (ele mesmo dono de uma empresa de inteligência), defendeu a privatização de missões pelas limitações estratégicas e de recursos da CIA.

- A ideia é achar quem é o melhor para o trabalho.

Uma nação cercada de importância e confusão

Arthur Ituassu
MESTRE E DOUTOR EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS PELO INSTITUTO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS DA PUC-RIO

Apesar da distância, não é de todo difícil para alguém no Brasil perceber a importância que tem a situação no Afeganistão para o ordenamento político internacional. A eleição que está lá do outro lado do mundo, de fato, afeta a tudo e a todos.

No coração da Ásia Central, o Afeganistão sofre da instabilidade crônica que até sua geografia corrobora.

Entre Irã, Paquistão, Rússia, China e Índia, todas potências nucleares ou quase isso, Cabul sempre foi palco de disputas acirradas.

Basta lembrar da guerra que os soviéticos travaram por lá durante dez anos, entre 1979 e 1989.

Do lado iraniano, Teerã nunca viu com bons olhos um projeto islâmico que lhe fosse competidor e por isso sempre tentou estar presente.

O Irã, por exemplo, prestou assistência aos mujahideen na luta contra o comunismo ateu, nos anos 1980, enquanto combatia o nacionalista Saddam Hussein, na guerra Irã-Iraque.

Do lado chinês, a preocupação sempre foi o separatismo muçulmano na região do Xinjiang, no Noroeste da China, que recentemente esteve nos noticiários.

Quanto mais forte e estável um regime islâmico no Afeganistão, pior para Pequim.

Com preocupação semelhante, estão os indianos. Com problemas com o islamismo radical no Paquistão, na Caxemira e também em Bangladesh, os indianos vêem com bons olhos um Afeganistão secular.

Quanto mais distante o Afeganistão estiver dos Talibãs, por exemplo, melhor para Nova Délhi. Os indianos, não à toa, estiveram ao lado dos soviéticos no apoio ao governo do Partido Democrático do Povo Marxista do Afeganistão, que lutava contra a resistência islâmica no país.

Da mesma forma, Moscou, apesar de ter perdido sua grande influência na região, com a retirada em 1989 e o desmembramento da antiga União Soviética, não gostaria de se ver na posição de ter um grande vizinho islâmico radical logo abaixo de sua fronteira no centro da Ásia em momento algum.

Em relação a Islamabad, o governo central tem sua própria luta interna para se manter dentro dos propósitos do secularismo. Apesar de contar com boa parte do apoio da população (pashtun) em províncias próximas à fronteira afegã, aqueles que lutam pelo restabelecimento de um regime islâmico no Afeganistão gozam da ira da autoridade central paquistanesa.

Uma verdadeira e generalizada instabilidade nesse terreno representaria uma ameaça de proporções nucleares.

Não à toa, foi no na Guerra do Afeganistão que Osama Bin Laden cresceu dentro do movimento islâmico radical, comandando os mujahideen na vitória contra, nada mais, nada menos, a União Soviética.

Como se não bastasse, agora e desde os atentados de 2001, estão também os Estados Unidos envolvidos no Afeganistão.

O presidente Barack Obama fez do país tema de campanha, defendendo que a verdadeira guerra contra o terrorismo se encontra lá, não no Iraque.

No coração da Ásia Central, país sofre da instabilidade que até sua geografia corrobora

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

PERDÃO

GILBERTO AMARAL

PERDÃO
Perguntaram ao General Norman, do Exército dos Estados Unidos, se ele perdoaria os terroristas
do 11 de setembro de 2001. A resposta: "Eu creio que a tarefa de perdoá-los cabe a Deus. A nossa é de
simplesmente arranjar o encontro".

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Reconstituição das Forças Armadas

O volume de recursos movimentado pela indústria de defesa, em todo o mundo, talvez seja inferior apenas ao dos negócios na área de petróleo e gás natural. Os lobbies dos grandes fabricantes de equipamento para as Forças Armadas estão sempre prontos a se engalfinhar, na disputa por mercados.

Os países que não possuem uma base industrial de defesa autônoma estão sujeitos a todo tipo de pressões externas e internas. Durante as décadas de 70 e 80 do século passado, o Brasil chegou a ter uma indústria de defesa de relativa importância, tornando-se exportador de equipamentos militares de média sofisticação. Infelizmente, pouco restou dessa época.

No final dos anos 80, a indústria nacional de defesa (que, por sinal, jamais pôde contar com encomendas certas de nossas próprias Forças Armadas) entrou numa crise da qual ainda não se recuperou totalmente. À falta de apoio governamental veio somar-se o viés ideológico antimilitar da maioria dos governos posteriores a 1985.

A nova Estratégia Nacional de Defesa (END) ainda não apresentou resultados práticos. Em junho, foi concluída a elaboração dos Planos de Equipamento e Articulação das três forças singulares para o período 2009-2030. A proposta de um Projeto de Lei de Equipamento e Articulação da Defesa Nacional, a ser submetida ao presidente da República, deve ser finalizada até setembro.

Enquanto isso, a grande imprensa dedica-se a publicar especulações ou notícias plantadas sobre diversos programas de aquisição de material para as Forças Armadas. Com frequência, são noticiadas supostas compras de equipamentos que, na realidade, não foram sequer selecionados entre os diversos participantes dos processos de concorrência.

Em valores corrigidos até 4/8/2009, a dotação autorizada do Ministério da Defesa para este ano é de R$ 52,61 bilhões, dos quais R$ 26,75 bilhões haviam sido empenhados e R$ 24,66 bilhões efetivamente pagos até aquela data. Transcorridos 216 dias (59,18%) do exercício fiscal, haviam sido desembolsados 46,88% do orçamento autorizado.

A situação orçamentária da Defesa em 2009 é apenas um pouco melhor que a do Orçamento da União como um todo. Neste orçamento, está previsto um total de recursos de R$ 1,681 trilhão, do qual R$ 1,349 trilhão foi empenhado e R$ 719,4 bilhões (42,79% do total autorizado) foram efetivamente pagos até 4 de agosto.

A recomposição progressiva do orçamento de defesa é essencial para viabilizar a reconstituição das Forças Armadas brasileiras, após duas décadas de sucateamento. Na área militar, assim como na diplomacia e em outras atividades de Estado, os políticos não devem tentar fazer o trabalho dos profissionais especializados, mesmo que isso pareça ser "politicamente correto".

Em junho deste ano, vimos como o profissionalismo dos militares é insubstituível, na gestão da crise humanitária ocasionada pelo acidente com o vôo 447 da Air France. O bom desempenho das tripulações dos meios aéreos e navais, empregados pela Marinha do Brasil e pela Força Aérea Brasileira, foi essencial para o cumprimento das missões de busca e resgate.

Comprovou-se o valor estratégico de ilhas oceânicas como Fernando de Noronha e Trindade, se dotadas de aeródromo com pista de dimensões apropriadas. Ampliar e modernizar a infra-estrutura de bases aéreas e navais, no Norte e no Nordeste do Brasil, é outra necessidade. A importância de uma doutrina de operações conjuntas e combinadas ficou demonstrada.

A crise serviu para dar visibilidade ao trabalho anônimo das Forças Armadas brasileiras, no desempenho de sua atividade-fim de defesa nacional e das atividades subsidiárias previstas na Constituição e nas leis. Tais atividades incluem o controle do tráfego aéreo e marítimo, assim como as operações de busca e salvamento, em terra ou no mar.

A pirataria marítima, que muitos (erroneamente) consideravam extinta, voltou a ser motivo de preocupação no século XXI. Em áreas como o litoral da Somália (na região conhecida como Chifre da África), a ação dos piratas constitui grave ameaça à navegação internacional. No Atlântico Sul, os casos registrados de pirataria limitam-se, até agora, ao litoral africano do Golfo da Guiné.

Entretanto, o recente desaparecimento de um cargueiro russo ao sul do Canal da Mancha pode ser um indício de que aquela atividade ilícita já chegou às águas européias e a outras áreas do Atlântico. O Brasil precisa manter a vigilância das águas sob sua jurisdição, assim como das rotas marítimas de seu interesse, a fim de evitar que tal ameaça assimétrica nelas se manifeste.

As Forças Armadas podem ainda ser convocadas para desempenhar operações de paz no exterior (no Haiti ou em outros países), bem como de garantia da lei e da ordem (GLO) dentro do próprio território nacional. Contudo, deve-se ter em mente que, em qualquer país, a finalidade das Forças Armadas é a defesa contra ameaças e agressões de origem externa.

Para que as Forças Armadas sejam um instrumento do Estado, é preciso que haja Estado. As relações internacionais pressupõem a existência de comunidades políticas independentes, dotadas de governo, as quais afirmam sua soberania sobre um território e uma população. O Estado nacional é a única forma de organização política democrática, de eficácia comprovada, atualmente disponível.

Para fortalecer o Estado brasileiro, a valorização dos militares e dos servidores públicos civis é essencial. O profissionalismo existente na área militar e na diplomacia deve ser estendido a todo o serviço público. As Forças Armadas, assim como o Itamaraty, conseguiram resistir à onda de desmonte do Estado no Brasil. Agora é preciso reverter os efeitos dessa onda.



Eduardo Italo Pesce

Especialista em Relações Internacionais, professor no Centro de Produção da Uerj.



Iberê Mariano da Silva

General-de-brigada engenheiro militar, na reserva.

Os que matam e os que morrem

OS MAIORES HERÓIS não são os ousados soldados que investem contra os inimigos; são os que morrem com as mãos nuas, como o brasileiro Sérgio Vieira de Mello morreu, há seis anos, em Bagdá. Os grandes guerreiros, como El Cid, o chefe militar espanhol do século 11 que, de acordo com a lenda, combateu depois de morto, com seu corpo atado a um cavalo, foram preparados para matar. Os norte-americanos cultuam a memória do cabo Alvin Cullum York, que, sozinho, matou, em um só ataque, 24 soldados alemães na ofensiva do Meuse, em outubro de 1918, e fez 132 prisioneiros. York foi o mais condecorado dos militares ianques e ganhou do Estado uma fazenda como recompensa.

Na resistência aos agressores, esses heróis são também necessários, como foram os pracinhas da FEB. Nas guerras de agressão não há heroísmo. Não houve heroísmo americano no Vietnã, como não houve heroísmo israelita em Gaza, mas, sim, crimes de Estado. Há os que vão às guerras só com a eventualidade da morte. Entre esses, os que pensam encontrar no suicídio o retorno de sua memória à condição humana, como ocorre aos americanos no Iraque e no Afeganistão.

A ONU decidiu, por iniciativa da Suécia, que a data de 19 de agosto seja dedicada aos 700 trabalhadores da paz, entre eles o nosso compatriota Sérgio Vieira de Mello, que morreram nos últimos 10 anos, e aos milhares de outros que sucumbiram antes. Embora possa haver, entre eles, religiosos, em sua maioria são apenas humanistas. Não os move qualquer recompensa transcendental, mas, sim, o sentimento de que é necessária a busca da paz. A paz não é só o emudecer das armas, mas o pão, a saúde, o conhecimento, a liberdade – e a justiça.

Os milhares de trabalhadores humanitários, a serviço das entidades internacionais, ou integrantes de organizações civis voluntárias, não veem os homens separados pela cor da pele, pelo domínio tecnológico, nem pelas fronteiras. Os seres humanos são iguais no sofrimento e semelhantes na esperança. A única diferença entre uns homens e os outros está na riqueza e na pobreza. A humanidade tem sido cruel com ela mesma. Os europeus que dominaram a África durante séculos não tornaram seus nativos mais felizes, mas os exploraram impiedosamente e os corromperam com seus próprios vícios. Hoje, sob o discurso da ajuda àquela parcela de seres humanos esquecidos, as grandes potências declaram sua solidariedade para com os que morrem em Darfur e nas inúmeras guerras tribais, ao mesmo tempo em que lhes levam migalhas, apropriadas por dirigentes cruéis, corrompidos e cooptados. O que lhes interessa é o domínio político e econômico do continente. Para essas grandes potências, e nisso não há diferença entre umas e outras, a “solidariedade internacional” não passa de um negócio. As instituições humanitárias da ONU conseguem realizar o que podem, não obstante a objeção, costumeira, dos estados mais poderosos.

O mundo jamais produziu tantos alimentos per capita como em nossos dias. Há comida bastante para que todos se nutram, sem excesso, nem desperdício. Mas, provavelmente, nunca houve tanta fome. As “doações” dos povos ricos para os famintos da África e de algumas regiões da Ásia só conseguem chegar aos necessitados com a intervenção dos trabalhadores humanitários. São servidores civis da ONU os que mantêm viva a população da Palestina e os milhares de refugiados dos conflitos étnicos da África. Sem seu trabalho, a tragédia seria ainda maior.

Esses trabalhadores não enfrentam só as dificuldades inerentes ao subdesenvolvimento econômico e cultural da África e de outros lugares.

Eles se confrontam com grandes empresas farmacêuticas que fornecem medicamentos sem eficácia, com fabricantes e traficantes de armas, que insuflam conflitos e promovem genocídios, e com os governos tirânicos que os querem longe. Eles são chamados a todos os continentes. Há pedaços da África no mundo inteiro: nos iglus de plástico e nos contêineres em que moram norte-americanos, nas vastas regiões de miséria na América Latina e Ásia – além de ser conduzidos à Europa nos braços e no sofrimento dos “extracomunitários”, tratados ali como se fossem ratos predadores.

Tocou-nos o penoso privilégio de que tenha sido escolhida a data da morte de Sérgio Vieira de Mello para marcar a homenagem aos humanistas que trabalham pela paz no mundo. No serviço da humanidade, Sérgio honrou a nossa gente

Os seres humanos são iguais no sofrimento e semelhantes na esperança

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

População decrescente



São comuns os cartazes espalhados pela capital pedindo à população que tenha filhos. Os pais costumam receber uma espécie de mesada a partir do segundo filho. A igreja ortodoxa instituiu o ano da família. Várias cidades fazem campanhas para estimular o aumento da população. Em Ulyanovski (cidade natal de Lênin), a 900 km de Moscou, o dia 12 de setembro foi decretado feriado. É o dia da concepção. Estão todos liberados do trabalho para se engajar na tarefa de aumentar a população cada vez mais reduzida do lugar. Quem apresentar os novos cidadãos ao governo local exatos nove meses depois pode ganhar uma série de prêmios que vão de dinheiro a geladeiras, passando por carros e máquinas de lavar. Parece que surtiu resultados em 2007: um aumento de 4,5% no número de nascimentos.

Apesar dos aparentes esforços das autoridades, a população russa deve continuar caindo nos próximos anos. Dados do PRB (Population Reference Bureau) indicam que, em 2050, o país terá 110,1 milhões de habitantes. No ano passado, eles eram 141,9 milhões. Isso significa uma queda de 22%.

A notícia está sendo encarada pelos jornais russos com certo otimismo, tendo em vista que os números mais recentes da ONU falavam em uma queda para 107 milhões de pessoas até 2050. O ministério da Saúde e Desenvolvimento Social garante que vai conseguir estabilizar a população em 145 milhões até 2025.

De todo modo, o número de nascimentos no ano passado foi de 12 para cada 1.000 habitantes, enquanto os óbitos chegaram a 15 por 1.000. O PRB avisa que, se nada for feito no curto prazo, em 2025 a população deve encolher para 129,3 milhões.

O relatório do PRB indica ainda que as maiores queda populacionais do mundo devem acontecer na Bulgária (35%), Swazilândia (33%), Geórgia (28%) e Ucrânia (28%). O número de japoneses e moldavos deve cair 25% e 23%, respectivamente. A população global, no entanto, vai continuar crescendo graças aos países em desenvolvimento. Em 2011 já deve bater a marca dos sete bilhões, apenas 12 anos após ter chegado a seis bilhões, em 1999.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Visão militar

O Globo 06/08/09

Míriam Leitão

O Exército se sente ameaçado pela presença de bases americanas na Colômbia? Um general me disse que não. Acha que os americanos deveriam ter nos informado previamente, mas lembrou, pragmático: "Entre as bases na Colômbia e o nosso território tem a selva. Não dá para as tropas se movimentarem por terra. Para isso, eles têm porta-aviões, bombardeiros que reabastecem no ar e supremacia aérea."
Hoje o Brasil tem 53 militares, de patentes diferenciadas, treinando em escolas americanas como West Point. Há uma longa tradição de cooperação. Ainda que mantendo-se a necessária distância. Visitas militares americanas, inclusive de oficiais de alta patente, têm sido mais frequentes.
- A gente sente que eles querem agradar, mas são meio atrapalhados. Não vejo qualquer ameaça militar americana ao Brasil nem direta, nem indireta - disse.
Há pouco mais de um mês houve uma competição das forças especiais de 21 países latino-americanos. É uma competição tradicional, sempre organizada, financiada e arbitrada pelos Estados Unidos. É uma espécie de competição de esportes radicais. O ganhador é sempre a Colômbia cujo Exército é treinado pelos americanos.
Desta vez, foi um pouco diferente. Nossas Forças Armadas disseram que como era em solo brasileiro, a competição seria organizada e arbitrada por brasileiros. Aceitaram apenas o financiamento americano. Quem ganhou foi o Brasil. O segundo lugar, surpreendentemente, foi do Equador, e a Colômbia veio em terceiro.
Ou seja, há espaço para visitas, intercâmbio e até olimpíadas militares entre os países da região. Nada lembra um clima belicoso. Para o general, o mal-estar agora foi causado por uma incapacidade americana de entender quais são os sentimentos e reações dos países latino-americanos em relação a eles.
Até por confusões históricas, o governo americano deveria ter consultado os países da região. Na visão do general, a tensão é causada mais por Hugo Chávez e ela pode vir a ser uma ameaça para o Brasil mais adiante.
- Ele hoje já controla o governo dele, da Bolívia, do Equador, tem influência na Argentina e Paraguai. No Peru, onde seu candidato Ollanta Humala perdeu no photochart, o presidente Alan Garcia está com baixíssima popularidade. Chávez jogará todo o dinheiro possível para controlar o governo de Lima. Quando acontecer isso ele completa seu arco bolivariano. Enquanto o governo brasileiro fizer tudo o que ele quer, fica tudo bem. Mas no futuro pode haver tensão entre nós. Eles têm força econômica, saída para o Pacífico, Atlântico, Caribe e um governo que gosta de confrontos. Nosso problema não é militar com os Estados Unidos, é de geopolítica da região - disse o general.
Para o militar, não há qualquer ameaça dos americanos sobre o território brasileiro. Na avaliação que faz, os americanos perderam a base de Manta no Equador, perderam a presença na Bolívia, onde a DEA (departamento de combate às drogas) trabalhava livremente. Além disso, não têm tido tanto sucesso assim na Colômbia:
- As Farc estão mais enfraquecidas, mas o tráfico não teve queda sensível. Os americanos já estão na Colômbia há muito tempo e todo mundo sabe.
Ontem, Hugo Chávez escalou e falou que as bases americanas na Colômbia podem detonar uma guerra na América do Sul. É claro, pura retórica. Ele gosta de manter esse clima de beligerância no qual cresce, aparece, e foge do desgaste provocado pelas crises política e econômica.
Nesta situação, cabe ao Brasil manter seu tradicional equilíbrio com o qual vem se mantendo em paz por mais de um século com os países do continente. O que deveria ser evitado é tomar satisfação da Colômbia e ser condescendente com a Venezuela. É achar normal que a Venezuela faça exercícios com a esquadra russa, mas tratar o acordo militar dos Estados Unidos com a Colômbia como um risco iminente de invasão do território brasileiro.
Quando veio a esquadra russa, circularam rumores de que o presidente Lula não gostou, mas oficialmente o Brasil não disse que os russos aqui, em águas venezuelanas, lembravam a guerra fria. Hugo Chávez criticou quem pensasse nisso. "Este é um velho plano. Trataram de especular que é a nova Guerra Fria, toda uma manipulação, isso não é nenhuma provocação, é um intercâmbio entre dois países livres e soberanos", disse Chávez na noite da chegada dos navios russos. No fim, os dois países assinaram um acordo para a construção de uma usina nuclear na Venezuela.
O semi-ministro das relações exteriores do Brasil, Marco Aurélio Garcia, disse sobre as bases americanas na Colômbia que cachorro mordido por cobra tem medo de linguiça. A expressão é engraçada, mas não traduz o clima no país, nem nas relações com os Estados Unidos. O Brasil não é uma republiqueta ameaçada, é um país soberano, que saberá manter essa posição. Não precisa tremer diante de qualquer coisa, nem deixar que o rabo balance o cachorro, como, por exemplo, aceitando que Chávez dê o tom da nossa atitude diplomática, na relação com o nosso maior parceiro comercial e país do qual recebemos o maior volume de investimentos.