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quinta-feira, 2 de outubro de 2008

O Google nos faz mais idiotas?


Os artigos e livros de Nicholas Carr têm sido uma fonte de desgosto para os aficionados de internet. No início deste ano, o jornalista e escritor americano lançou The Big Switch (“A grande virada”), em que revela os perigos de uma rede de compu-tadores cada vez mais inteligente e poderosa. Agora volta à carga em artigo na revista Atlantic Monthly, no qual aborda uma ameaça mais sutil do mundo virtual. Carr deu-se conta dela ao perceber que tinha cada vez menos paciência para ler textos longos ou livros. Sua concentração se dispersava depois de duas ou três páginas. “Estou sempre tentando trazer minha mente de volta ao texto”, diz. O que antes fazia com prazer virou um martírio. “Não penso mais da maneira que costumava pensar”, lamenta. Carr está convicto de que não se trata de um problema pessoal. Ex-editor da Harvard Business Review, ele ouviu blo-gueiros e intelectuais que confessaram igual dificuldade para chegar até o último parágrafo de um livro.
O título do artigo – O Google está nos tornando estúpidos? – dá uma pista. Carr acredita que a internet transformou nossas mentes. Os meios de comunicação não são canais passivos de informação. “Eles fornecem o conteúdo de nossos pensamentos, mas também modelam o processo de pensamento”, diz Carr, citando o pensador canadense Marshall McLuhan. Resultado? Um internauta que salta de site em site condiciona a mente a receber informações de forma rápida e superficial. Os circuitos neuro-lógicos adaptam-se a essa nova realidade, afirma o escritor, baseado em pesquisas que mostram que o cérebro, mesmo o de adultos, é dotado de enorme plasticidade. “O cérebro consegue se reprogramar em pleno vôo, alterando a forma como funciona”, afirma o neurocientista James Olds, da George Mason University, em apoio aos argumentos de Carr.
Uma pesquisa recente da University College London confirma a dificuldade que as pessoas têm hoje de mergulhar em textos longos. O levantamento examinou, durante cinco anos, o comportamento dos visitantes de dois populares sites de pesquisa – da Biblioteca Britânica e de um consórcio de instituições de ensino – que dão acesso a jornais, e-books e outras fontes de informa-ção. Descobriram que os usuários exibem um comportamento ligeiro e inconstante. Lêem no máximo uma ou duas páginas de um artigo ou de um livro antes de trocar de site. Alguns arquivam textos longos, mas raramente voltam a consultá-los. “Fica evidente que os usuários não lêem no sentido tradicional”, dizem os autores do estudo. “É uma nova forma de leitura. Navegam por títulos, sumários e resumos de textos. Parece que estão online apenas para evitar uma leitura no sentido tradicional.”
A mesma superficialidade parece contaminar a academia, segundo estudo recente do sociólogo James Evans, da Universida-de de Chicago. Apesar de ter à sua disposição uma quantidade cada vez maior de versões online de publicações científicas, os pesquisadores tendem a pesquisar na internet um número reduzido de artigos – os mais comentados entre os colegas, ignorando todo o restante. “A pesquisa científica online acelera o consenso”, diz Evans. É um comportamento bem diferente daquele exibido por pesquisadores de outras eras, que gastavam um tempo enorme fuçando trabalhos em bibliotecas e que, pela própria natureza da consulta, esbarravam em trabalhos de diferentes campos do conhecimento, que, ao final, acabavam sendo citados nos seus estudos.
A repercussão do artigo de Carr foi imediata. Em seu blog, o escritor Evan Ratliff, colaborador da revista The New Yorker e do jornal The New York Times, disse que o uso incessante da internet provavelmente afeta também a nossa memória, uma vez que não temos mais a necessidade de lembrar daquilo que está facilmente à nossa disposição no universo virtual. O que não é, ne-cessariamente, negativo. São circuitos neurológicos que podem ser empregados em outras atividades.
Muitos apontam um pessimismo exagerado em Carr. O jornalista Kevin Kelly, editor da revista Wired, afirma em seu blog que, se o nosso desempenho intelectual cai quando estamos fora da rede, melhora quando estamos online. “Será que não ficamos mais idiotas quando estamos fora do Google, mas mais espertos quando estamos no Google? É muito provável que sim”, diz. Para Danny Hillis, escritor e consultor da IBM e da Hewlett-Packard, o autor de The Big Switch erra ao apontar o culpado. “O dilúvio que está nos afogando é o do excesso de informação”, afirma. Para ele, o Google e outros instrumentos da internet apenas nos ajudam a sobreviver em meio ao enorme fluxo de dados da sociedade contemporânea.

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