Em livro, Stephen Kinzer defende que, para estabilizar o Oriente Médio, - a aliança de Washington com Israel e Arábia Saudita deve ser superada
Denise Chrispim Marin, CORRESPONDENTE/ WASHINGTON
A aliança de mais de 40 anos entre EUA, Israel e Arábia Saudita está há tempos superada e deve ser posta em segundo plano, em favor da comunhão de interesses estratégicos entre Irã, Turquia e EUA. Essa visão foi expressa pelo jornalista e professor das universidades Boston e Northwestern, Stephen Kinzer, em seu recente livro Reset ("Reinício", em tradução livre).
Ao Estado, Kinzer admitiu que fazer desse triângulo uma realidade não é nada fácil, nem mesmo no longo prazo. Mas, além de não considerá-lo impossível, ele insiste que essa é a chave para a estabilização do Oriente Médio.
"A Turquia pode ter facilmente uma parceria mais afinada com os EUA porque ambos são democracias consolidadas, sócios da Otan e têm uma visão aberta. O Irã é uma sociedade essencialmente democrática. Mas, como está dominada por um regime repressor e teocrático, não há como se estabelecer uma relação próxima com os EUA", explicou Kinzer, que foi correspondente do jornal The New York Times na Turquia. "A saída seria uma aproximação por interesses estratégicos."
Um dos interesses que poderiam aproximar Washington e Teerã foi exposto com crueldade na quinta-feira, quando um duplo atentado organizado pelo grupo sunita Jundallah deixou 21 mortos no Irã.
Politicamente, o Irã é o opositor máximo dos radicais sunitas, que se expressam principalmente por meio do Taleban e da Al-Qaeda. "O Irã pode atuar como um estabilizador do Iraque e do Afeganistão, o que seria de enorme interesse dos EUA. Não há como estabilizar o Afeganistão sem uma solução regional da qual o Irã teria de ser parte."
Outro elo comum diz respeito à necessidade de o Irã reconstruir sua infraestrutura petroleira - algo que coincide com o interesse de companhias americanas. Para Kinzer, uma aliança mais forte entre Irã e Turquia já seria um grande passo para estabilizar o Oriente Médio e ajudar a reconstruir a confiança entre Teerã e Washington.
Sanções. Kinzer reconhece que o polêmico programa nuclear iraniano trouxe um obstáculo monumental. Em sua opinião, não será possível uma solução negociada, conforme as premissas definidas pelos EUA, para o impasse criado.
"Se você se coloca na pele dos iranianos, percebe que eles têm argumentos para manter o programa nuclear militar. Os países só fazem concessões na área de segurança se não se sentirem ameaçados. E esse não é o caso do Irã, que está rodeado por grupos radicais e países sunitas", afirmou.
QUEM É
STEPHEN KINZER: Jornalista e professor, foi correspondente do "New York Times" em Manágua, Berlim e Istambul, onde morou por quatro anos. É autor do livro "Crescent and Star: Turkey Between Two Worlds" ("Crescente e Estrela: a Turquia entre dois mundos", em tradução livre). Atualmente, escreve sobre política externa para o jornal britânico "The Guardian".
Nova aliança poderia facilitar acordo de paz
Denise Chrispim Marin, correspondente em Washington
WASHINGTON
O jornalista Stephen Kinzer acredita que o acordo de troca de urânio iraniano enriquecido por combustível nuclear, obtido por Turquia e Brasil, em maio, foi altamente positivo. No entanto, segundo ele, foi assinado em um momento de mau humor de Washington, que já preparava outra saída para o problema - o apoio dos demais membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU para novas sanções.
De acordo com Kinzer, um novo triângulo entre EUA, Irã e Turquia não significaria a superação completa da formação anterior (EUA, Israel e Arábia Saudita), principalmente por causa dos laços entre Washington e Tel-Aviv e da demanda americana por petróleo.
Com os sauditas, porém, a relação está desgastada. Washington não tem dúvidas de que a Arábia Saudita tem fomentado o terrorismo e apoiado o Taleban no Afeganistão. Dentre os 19 sequestradores dos aviões comerciais usados nos ataques de 11 de setembro de 2001, 15 eram sauditas.
O triângulo EUA-Israel-Arábia Saudita foi uma criação que serviu a seus propósitos ao longo da Guerra Fria, segundo o autor. Ele lembra, entretanto, que a formação não foi capaz de produzir um acordo de paz consistente entre israelenses e árabes e também não conseguiu estabilizar o Oriente Médio.
De acordo com ele, o novo triângulo pode não ser uma panaceia, mas abriria os contatos com outros vasos comunicantes da região, que são essenciais para um acordo entre Israel e a Autoridade Palestina.
Para Kinzer, se a possibilidade de paz depender da negociação apenas entre israelenses e palestinos, nada sairá do lugar, especialmente porque Binyamin Netanyahu ou qualquer outro primeiro-ministro israelense poderia fazer as concessões necessárias para um acordo.
"É preciso adotar um novo modelo de negociação, no qual sejam incluídas todas as partes aparentemente secundárias da questão, para que surjam as concessões necessárias." / D. C. M.
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