PHNOM PENH - O torturador-chefe do regime cambojano do Khmer Vermelho disse nesta segunda-feira a um tribunal especial que as políticas americanas da década de 1970 no Sudeste Asiático contribuíram com a ascensão daquela cruel ditadura.
Kaing Guek Eav, o Duch, primeiro de cinco dirigentes do Khmer Vermelho a ser julgado pelas atrocidades cometidas durante o regime (1975-79) que matou 1,7 milhão de cambojanos, disse que o grupo do ditador Pol Pot teria sumido se os EUA não tivessem se envolvido no Camboja.
"(O presidente dos EUA) Richard Nixon e (o secretário de Estado) Henry Kissinger permitiram que o Khmer Vermelho agarrasse oportunidades de ouro", disse Duch, de 66 anos, no início da segunda semana do seu julgamento, em um tribunal promovido conjuntamente pela ONU e pelo governo do Camboja.
O réu dirigiu a célebre prisão S-21, onde mais de 14 mil "inimigos da revolução" foram torturados e mortos.
Na semana passada, ele pediu perdão por seus crimes. Acusado de crimes contra a humanidade, crimes de guerra, tortura e homicídio, Duch pode ser condenado à prisão perpétua.
Questionado pelo juiz sobre como aderiu ao Khmer Vermelho, Duch deu uma longa e errática explicação, que incluiu as referências a Nixon e Kissinger.
O Camboja se tornou um campo de batalha da Guerra Fria em 1969, quando o governo Nixon começou a bombardear rotas no leste do país que os norte-vietnamitas (pró-soviéticos) usavam para levar homens e suprimentos para seus combates no Vietnã do Sul, que tinha um governo aliado dos EUA.
Em 1970, o príncipe (hoje "rei-pai") do Camboja, Norodom Sihanouk, foi deposto por um golpe comandado pelo general pró-americano Lon Nol, que entrou em guerra contra os comunistas do Vietnã e do próprio Camboja.
Sihanouk posteriormente estabeleceu aliança com o Khmer Vermelho e conclamou os cambojanos a lutarem contra o regime de Lon Nol, derrubado em 1975 pelo Exército de Pol Pot.
"O príncipe Sihanouk convocou o povo cambojano a aderir ao Khmer Vermelho comunista na selva, e isso permitiu que o Khmer Vermelho acumulasse suas tropas entre 1970 e 75," disse ele.
Sem isso, alegou Duch, "acho que o Khmer Vermelho teria sido demolido."
O regime do Khmer Vermelho foi derrubado por uma invasão vietnamita em 1979. Após a morte de Pol Pot, em 1998, Kissinger defendeu a decisão de bombardear o Camboja como sendo parte da Guerra do Vietnã, e disse que o fato não teve relação com as atrocidades cometidas posteriormente no país.
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