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quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Brasil deve ter presença militar no Oriente Médio

País acerta comando da frota de missão de paz da ONU no Líbano
Até 300 soldados podem ser enviados; atitude é parte de estratégia do governo Lula de tornar o país um ator relevante
FÁBIO ZANINI
EDITOR DE MUNDO
LUIS KAWAGUTI
DE SÃO PAULO

O Brasil deverá ter uma presença militar no Oriente Médio, seguindo a estratégia do governo Lula de tornar o país um ator relevante na conturbada região.
O governo está em conversas avançadas para integrar o comando da Unifil, a missão de paz das Nações Unidas no sul do Líbano.
As tratativas começaram no primeiro semestre. Segundo o DPKO (Departamento de Operações de Paz da ONU), a negociação está em "finalização de detalhes", mas não há prazo para sua conclusão.
A presença teria diversas etapas. A primeira, em estado mais adiantado, é assumir o comando da força naval da Unifil, atualmente a cargo dos italianos.
O Brasil deve enviar de cinco a dez oficiais graduados da Marinha, que comandarão uma frota de oito navios e 885 homens.
Segundo um diplomata que acompanha a negociação, esse convite já foi "pré-aceito", mas é preciso que o acordo passe pelo Congresso Nacional.
A segunda etapa, ainda em estágio embrionário, prevê enviar de 250 a 300 homens do Exército para a missão, que tem no total 11.449 homens de 31 países.
A Unifil, criada em 1978, tem como tarefa evitar confrontos entre o Exército de Israel e guerrilheiros do Hizbollah, milícia xiita que não aceita o Estado judeu.
Nem sempre isso é possível: a última guerra na região foi em 2006. Outro objetivo é impedir a entrada ilegal de armas na região.
Em agosto, um estudo técnico sobre o envio das tropas foi elaborado pelo Coter (Comando de Operações Terrestres do Exército) e está atualmente em análise no Ministério da Defesa.
Se concretizada, essa será a maior mobilização militar do Brasil em território estrangeiro desde a missão no Haiti, que se iniciou em 2004 e tem hoje 2.166 militares.
O Brasil atualmente integra dez missões de paz da ONU, mas, com exceção do Haiti, tem apenas observadores militares e especialistas. Nenhum no Oriente Médio.
Numa etapa final, o Brasil forneceria à ONU equipamentos, que ainda estão sendo negociados. A maioria deles seria de veículos militares blindados para transporte de tropas de combate.
Procurado pela reportagem, o Ministério da Defesa afirmou que "ainda não há decisão sobre o assunto".

EMBARCAÇÃO
A Folha apurou que a ONU pede que o Brasil envie ao menos uma embarcação para integrar a frota, mas o Ministério da Defesa reluta, alegando que isso prejudicaria a depauperada estrutura da Marinha.
As tropas do Exército podem ser apresentadas como uma contrapartida.
Diplomatas ouvidos pela Folha sob condição de anonimato afirmaram que, independente da formalização do acordo sobre a parte naval, um primeiro pelotão do Exército já poderia viajar no ano que vem.
O pedido de integrar o comando da Unifil foi encarado pelo Itamaraty como mais uma oportunidade de "entrar no jogo" no Oriente Médio -após tentar intermediar um acordo com o Irã na área nuclear e servir de interlocutor na libertação de uma americana presa em Teerã.
Seria, na visão da diplomacia brasileira, um trunfo para realizar o antigo sonho de ser chamada para ajudar na resolução do conflito Israel-Palestina, além do reconhecimento de maior estatura internacional.


País deverá ser ressarcido apenas de forma parcial
DE SÃO PAULO

O Brasil terá gastos com mantimentos, armamentos e manutenção de equipamentos na missão do Líbano. Apenas parte desses gastos será ressarcida pela ONU.
Não existe ainda um cálculo do custo. Além do soldo normal do governo brasileiro, os militares que servem em missões de paz recebem complementação paga pela organização internacional.
Na missão do Haiti, a remuneração mensal varia entre R$ 1.652 (soldados) e R$ 7.480 (generais)
Historicamente, o Brasil prefere investir em equipamentos e alimentação de padrão mais elevado do que o solicitado pela ONU. Por isso, o índice de ressarcimento dificilmente supera 40%.
Um exemplo disso é a missão de paz no Haiti. Desde o início da operação, em 2004, o Brasil investiu aproximadamente R$ 1,3 bilhão para treinar e enviar militares ao país caribenho.
Até agora o reembolso pago pela ONU foi de R$ 328 milhões (25% do valor investido). Ou seja, o Brasil gastou perto de R$ 1 bilhão.
Isso significa, por um lado, que o militar brasileiro atua no exterior com materiais de qualidade superior.
Mas também é indício de que nem sempre o país consegue cumprir as normas do complexo sistema de pagamentos por uso de tropas.
Por levar equipamentos de padrão diferente do exigido, o país acaba não sendo reembolsado pela ONU.
O Brasil tem um centro de treinamento para missões de paz, no Rio de Janeiro, mas não tem unidades militares específicas para participar desse tipo de missão. Por isso, a seleção dos interessados em participar costuma ser voluntária.

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